quinta-feira, 5 de julho de 2012

Um dia de fúria


Esta situação já faz tempo, mas aconteceu na cidade em que moro.

Estava em um ponto de ônibus esperando o coletivo que me levaria a meu destino. O ponto estava muito cheio e o banco estava repleto de pessoas sentadas esperando a suas conduções. Eu, por falta de lugar esperava em pé quando percebi uma mulher a me olhar com uma expressão fechada no rosto. Achei estranho, mas continuei parado esperando o ônibus. O olhar dessa senhora que aparentava uns cinquenta anos ia se fechando cada vez mais e o seus olhos iam arregalando e cada vez mais incisivos para mim. Pude notar um tom de raiva que parecia se acumular naquela mulher a cada minuto que se passava. Parecia que a qualquer momento iria explodir de tão cheia de alguma coisa que eu ainda não podia decifrar.

Subitamente a mulher reage gritando de forma frenética e descontrolada. Eu ainda não havia percebido que tal comportamento tinha alguma ligação comigo até que comecei a notar o que a senha dizia.

“Macumbeiro desgraçado... Filho do cão... O diabo tem que morrer...”

Fiquei assustado, mas até então não havia percebido o porquê disso tudo e não conseguia saber  como aquela mulher adivinhara que eu era umbandista.
Foi então que notei que uma de minhas guias aparecia, saindo de dentro da minha camisa entre meu pescoço e a gola da camisa. Fiquei assustado, mas continuei assistindo tudo parado no ponto de ônibus.  De repente esta mulher aos berros agarra um grande pedaço de vidro quebrado no chão e parte para cima de mim dizendo que eu devia morrer. Dei alguns passos para traz e as pessoas que também esperavam seus ônibus a contiveram.

A mulher continuava a gritar presa pelas pessoa que ali esperavam sua condução.

“Vou chamar a policia. Esse tipo de gente não pode andar livremente pelas ruas em que andam pessoas de Deus...”.

Fiquei com muito medo e entrei no primeiro ônibus que passou.
Em quanto o ônibus arrancou e se pôs em movimento eu vi pela janela aquela senhora a me olhar com um ódio enorme.

O ônibus já estava quase em meu destino, mas aquela situação não me saia da mente.  E me vinha uma única pergunta. “Por que disso tudo?”.
Um ódio gratuito que nasceu em virtude da nossa diferença religiosa? Um ódio forjado pela ignorância e palavras de pessoas que se promovem em cima de mentiras?

Queria eu que aquela senhora conhecesse a grandeza e humildade de todos os guias que “descem” nos terreiro de umbanda trazendo a paz e o aconchego para quem necessita.  Estes mesmos guias que em vez de um ódio gratuito entregam o amor incondicional a todos que deles precisam.  Será que tal senhora ainda teria esse ódio ao saber que mesmo sem a conhecer “os nego ama todos os fio da terra”?

Fui pensando e repensando e por um instante me senti muito feliz por ser quem sou. Relembrei de toda minha jornada como umbandista até aquele momento. Relembrei da fala das entidades que trabalham na casa em que frequento. De tudo que fazemos sem julgar quem recebe e senti um orgulho de olhar para aquelas guias que eu usava por baixo de minha camisa. Senti uma satisfação de vestir todo final de semana minha roupa branca e me postar de pés descalços  recebendo meus guias espirituais. Naquele momento eu me senti pleno, pois eu vi que verdadeiramente eu era parte de uma coisa muito grande e muito bonita que se chama UMBANDA.

Às vezes eu me recordo dessa situação e me lembro desse sentimento bom que tomou conta de mim neste dia que me deparei com a intolerância e a ignorância. E a cada dia que eu me posto diante do meu congá e bato cabeça para meus Orixás o mesmo sentimento toma conta de mim outra vez. Neste momento reverencio minha religião e me preparo mais uma vez para um novo dia de trabalho...

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